O setor naval ainda vive à sombra da crise e da falta de novas encomendas no horizonte. Mas os estaleiros nacionais não se rendem diante do cenário difícil, buscando alternativas para manter as atividades e, consequentemente, diversos empregos. É o caso do Vard Promar, na cidade de Ipojuca, em Pernambuco. A estratégia traçada – e que já está sendo colocada em prática – é buscar uma atuação mais firme na área de reparo naval, conforme revela o vice-presidente sênior da Vard no Brasil, Guilherme Coelho. Outra oportunidade que traz bastante esperança é a licitação das corvetas para a Marinha do Brasil. “Estamos trabalhando fortemente para estarmos competitivos e ganharmos esse projeto. Isso geraria trabalho por quase oito anos”, afirmou o executivo. Hoje, o estaleiro está atuando na construção de três embarcações, sendo que duas delas têm entrega prevista para outubro: um navio gaseiro para a Transpetro e um píer flutuante para o Porto de Kingston, na Jamaica.

Quais os principais projetos em andamento no estaleiro atualmente?

Nós temos um gaseiro que está sendo construído para Transpetro e deve ser entregue agora em outubro. Temos também um PLSV (lançador de linha) que está sendo construído para uma joint venture entre DOF e Technip e deve ser entregue em meados de dezembro. E ainda temos um píer flutuante construído para o Porto de Kingston, na Jamaica. Ele deverá ser entregue em meados de outubro.

Além dos projetos em andamento, como está a prospecção de novos negócios?

Estamos conversando com alguns potenciais clientes, mas tudo ainda está muito incipiente. Nada próximo de ser assinado. O mercado está muito retraído e não temos notícias de novas obras em lugar nenhum. Então, estamos conversando com diversos players, inclusive internamente no grupo.

Uma coisa que temos feito muito são atividades de reparo. Ficamos fora desse negócio por muitos anos, mas voltamos agora nos últimos três meses. Já rebocamos quatro navios para fazer reparos. É um setor que esperamos continuar desenvolvendo. Somos um estaleiro de primeira, dentro de uma localização geográfica com muitas poucas opções. Entendemos que é uma área que pode realmente crescer bastante, porque oferecemos um excelente serviço.

Qual a perspectiva de novos contratos em óleo e gás, tendo em vista a redução de exigência de conteúdo local?

Não tenha dúvida de que a redução de conteúdo local impacta a indústria diretamente. A construção naval no Brasil é baseada em três pilares primordiais. O primeiro deles é o financiamento pelo Fundo da Marinha Mercante (FMM). O segundo é a questão da proteção da bandeira, que aqui no Brasil é parcial. E o terceiro é o conteúdo local, que foi reduzido a patamares que conseguem ser supridos sem a necessidade de construção local na maior parte dos casos. O impacto foi muito grande para a indústria e a esperança reside na revisão desse tema. É preciso continuar as conversas para entender esse impacto e, eventualmente, que se volte a valores históricos, porque a indústria [naval], após o seu começo, teve uma curva de aprendizado grande. Agora, a indústria naval está atingindo níveis de eficiência muito bons, já chegando bem próximo ao patamar industrial. A parada das obras vai fazer com que o setor perca essa melhora.

Também precisamos esperar que o mercado esquente, em decorrência dos últimos leilões. É muito importante que o governo continue com esse cronograma de leilões, porque isso fará que a demanda volte a crescer.

Muitos alegam que a indústria naval não tem grande competitividade, mas recentes casos de entregas no prazo comprovam o contrário. Como o senhor avalia isso?

Veja bem, a indústria naval brasileira recomeçou. Ela vive de ciclos, aparecendo e desaparecendo. E toda a vez que um ciclo de produção é interrompido, a eficiência é perdida. Foi o que aconteceu com o Brasil. Quando retomamos a indústria naval, ela estava em sua infância, dando seus primeiros passos. Por isso, não tinha como comparar com mercados como China, Japão ou Coreia. Não dá para comparar com esses países que já estão fabricando de maneira ininterrupta por 50 anos. Os nossos números têm melhorado de uma forma significativa e eu acredito, que em um prazo não tão longo, estaremos com níveis de competitividade internacionais. Mas, nesse caso, eu sempre excluo a China, pois ela tem outros fatores como custo social inexistente e financiamentos mais subsidiados. A China sempre estará um pouco à parte, mas o Brasil tem condição de competir com Europa, Coreia e Singapura. E estamos chegando lá.

Quais medidas o próximo governo deverá adotar para criar novos negócios dentro do mercado naval?

O Brasil tem três áreas que podem se desenvolver muito e que impactam a área da construção naval. O primeiro ponto é o óleo e gás, que sempre foi o grande motor da construção naval no Brasil e acredito que não deixe de ser por um longo período. Acho que manter uma política de conteúdo local é muito importante. Isso porque gera empregos e tributos. E o que se tem de retorno não é apenas o emprego, mas tudo o que advém. Por exemplo, aqui em Pernambuco, se você olhar como era a cidade de Ipojuca antes da chegada do Vard e olhar o que ela era em 2014 (quando o setor ainda vivia um bom momento), é uma comparação impressionante. Isto é, gerou desenvolvimento para fora do eixo Rio-São Paulo.

O segundo ponto é a cabotagem. Passamos recentemente por um episódio de greve dos caminhoneiros, que causou um caos total no Brasil. Eu espero que as pessoas tenham chegado à conclusão de que estamos reféns do transporte rodoviário. Um país que tem 7 mil quilômetros de costa, é uma coisa que não faz muito sentido. Por isso, o incentivo à indústria de cabotagem é essencial. Acho que nos últimos 10 anos, foram construídos 22 navios para a indústria de cabotagem, destes apenas quatro no Brasil. Isto é uma pena, porque o Brasil tem uma vocação marítima e tem que ter essa vocação. E não apenas a costa, mas também para a parte de transporte fluvial. Isso deveria ser feito para abrir alternativas de logística de transporte.

O terceiro fator é a Marinha do Brasil, que tem uma frota antiga e que precisa modernizá-la. Como disse, temos 7 mil quilômetros de costa e vários rios que precisam ser patrulhados. Temos 30 bilhões de barris no pré-sal que precisam ter segurança garantida. Mas a Marinha ainda não tem navios para isso. É importante que se dê orçamento para que ela modernize sua frota. E aí existem fundos, como o FMM, que poderiam ser utilizados pela Marinha para isto.

Como o estaleiro pretende driblar este momento de baixas encomendas?

A primeira estratégia eu já mencionei, que é a questão do reparo. Já começamos a atuar na área, onde não estávamos muito envolvidos. Para um estaleiro do nosso porte, a parte de reparos é importante, mas não o suficiente. E a segunda é a diversificação da clientela. E a Marinha é uma grande esperança nossa. Ela lançou, no final do ano passado, um pedido de cotação para construção de quatro corvetas. Nós estamos participando, juntamente com nossa acionista majoritária, que é o Grupo Fincantieri, que é o mais tradicional na construção militar no mundo. Estamos trabalhando fortemente para estarmos competitivos e ganharmos esse projeto. Isso geraria trabalho por quase oito anos. (Petronotícias)