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Uma metodologia para o setor sucroenergético



Estudo promove avaliação termoeconômica da cogeração de energia no segmento

Tese desenvolvida pelo engenheiro mecânico Aristides Bobroff-Maluf, junto à Área de Térmica e Fluidos, da Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp (FEM), orientada pelo professor Caio Glauco Sanchez, apresenta metodologia para avaliação termoeconômica da geração conjunta da energia térmica e elétrica no setor sucroenergético (açúcar, etanol e energia elétrica), visando obter informações de cunho energético e econômico para a otimização dos processos.

Sobre o título da tese, “Avaliação termoeconômica da cogeração no setor sucroenergético com o emprego de bagaço, palha, biogás de vinhaça concentrada e geração na entressafra”, o autor explica: a avaliação termoeconômica corresponde a uma metodologia realizada com base na produção de energias elétrica e térmica (geração de vapor), sob o ponto de vista técnico e econômico; a cogeração corresponde à produção simultânea de energia elétrica e térmica a partir dos combustíveis passíveis de serem utilizados (bagaço, palha e vinhaça). Ele propõe, ainda, que, na entressafra, período em que não há produção de cana de açúcar e o sistema permanece ocioso, a produção de energia seja realizada através da queima de biocombustível complementar como, por exemplo, eucalipto.

O bagaço é subproduto da indústria e resulta da moagem da cana da qual é extraído o caldo para a produção de açúcar e etanol. Ele é utilizado atualmente como combustível para a produção de vapor que aciona as caldeiras e as turbinas responsáveis pela geração de energia elétrica. A palha, constituída das folhas da cana, também pode ser utilizada como combustível, embora cerca de 50% dela fique no campo.  Da vinhaça, subproduto da produção de etanol, pode ainda ser obtido e utilizado o biogás combustível metano, através de biodigestores.

O pesquisador trabalhou durante 21 anos em empresas do setor sucroenergético: Dedini e Copersucar, em Piracicaba, e AKZ Turbinas, em Ribeirão Preto. Em 1983/1984, através de uma bolsa da Fundação Krupp (Alemanha) estagiou por um período de um ano e quatro meses na AEG Kanis Turbinenfabric, fabricante de turbinas a vapor, em Nuremberg, sul do país.  Atualmente é docente na Escola de Engenharia de Piracicaba, mantida pela Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba (EEP/FUMEP), onde leciona vibrações mecânicas e engenharia de controle.

CONTEXTO
Desde a década de 1980, o bagaço queimado em caldeiras gera toda a energia necessária aos processos industriais das usinas canavieiras, permitindo-lhes a autossuficiência energética. A privatização do setor elétrico, a partir do final da década de 1990, possibilitou ao setor sucroenergético a comercialização de excedentes de energia elétrica (bioeletricidade), o que demandou investimento em equipamentos e tecnologias de maior eficiência na geração elétrica.

Das aproximadamente 400 usinas do setor no país que têm cogeração, um pouco mais de 25% delas geram excedentes comercializáveis, segundo dados da União da Indústria da Cana de Açúcar (Única). Embora exista uma tendência no aumento dessa  venda de energia, pois a energia disponível comercializada é um grande incentivo para o setor, essa possibilidade está atrelada a investimentos em equipamentos mais eficientes, como caldeiras que trabalhem com alta pressão e temperatura, processos que exijam menor consumo de vapor, turbinas a vapor com maiores potenciais e eficiências, entre outros.

Hoje a energia gerada pelas usinas utiliza essencialmente a queima do bagaço como combustível. A palha era queimada no campo, como forma de facilitar o corte manual da cana. As primeiras regulamentações a partir da década de 1990 estabeleceram as colheitas sem queima. Em 2007, a Única e o Governo do Estado de São Paulo assinaram protocolo que promoveu a antecipação do marco legal que determina metas para a mecanização da colheita e redução das queimadas. O prazo para a extinção da queima da palha de cana-de-açúcar em áreas mecanizáveis foi antecipado de 2021 para 2014 e em áreas não mecanizáveis, com declividade acima de 12%, de 2031 para 2017.

A palha resultante da colheita sem queima, deixada no campo, se decompõe gradualmente, agregando nutrientes ao solo. Esse procedimento evita emissões dos gases causadores do efeito estufa, contribui para a conservação da umidade do solo e favorece a reciclagem da matéria orgânica. A recuperação de parte dessa palha, de forma a deixar no campo quantidades ainda suficientes para a obtenção dos benefícios agronômicos, oferece a oportunidade ímpar de se agregar um novo combustível, além do bagaço, para a geração de bioeletricidade. A palha tem um poder calorifico quase duas vezes superior ao bagaço, embora seu recolhimento, limpeza e preparo acarretem custos operacionais e necessidade de investimentos significativos.

O ESTUDO
As usinas e destilarias produzem a energia elétrica que consomem em motores elétricos de acionamento das bombas, exaustores, etc., e nas empresas modernas, que apresentam alto rendimento, há um excedente dessa energia, que é vendida, exportada, para a rede elétrica. Ao se propor desenvolver uma metodologia para a avaliação termoeconômica de uma unidade termoelétrica do setor sucroenergético, o autor realizou balanços de massa, energia das plantas industriais, usando o simulador Cycle-Tempo.

O balanço de massa permite contabilizar a quantidade de água transformada em vapor. Através do balanço de energia chega-se à energia proveniente do combustível efetivamente utilizada nos processos. Por sua vez, o balanço de exergia permite dimensionar a energia que é efetivamente transformada em trabalho útil. Portanto, a análise energética quantifica a energia disponível e a análise exergética possibilita ainda qualificar a energia. Através dos conceitos da exergia se consegue localizar os pontos de baixo rendimento nos processos para posteriormente otimizá-los. Por sua vez através do emprego do software Cycle-Tempo realizam-se simulações que permitem balanços de massa, de energia e de exergia de forma a que possa ser determinado o processo mais adequado. Já para estudar a viabilidade econômica da planta industrial o autor adotou a metodologia do fluxo de caixa.

Além de tudo, Aristides realizou o estudo da sensibilidade dos sistemas, que mostra a variação do custo específico da bioenergia produzida levando em conta incertezas. Ele explica: “Quando se calcula o custo específico da eletricidade (R$/kWh) leva-se em conta o custo dos equipamentos, do combustível, dos impostos pagos, da operação e manutenção dos equipamentos, entre outros. Esses custos envolvem incertezas, pois o combustível pode variar de preço, a exemplo de outros implementos e dos impostos, de modo que deve ser fixada uma estimativa da variação porcentual desses itens e elas se refletem na incerteza do valor final”.

O trabalho simulou também cenários para a queima da palha de cana. A palha contém compostos de potássio, sódio e cloro. Se utilizada diretamente nas caldeiras ocorrerão depósitos de substâncias desses elementos nos tubos, dificultando a troca de calor.  Em vista desse problema o autor delineou dois cenários. O primeiro sugere a queima em temperaturas mais baixas, de forma a diminuir os depósitos nos tubos. O segundo propõe a trituração, lixiviação e lavagem, ou seja, a retirada dos elementos indesejáveis e secagem da palha antes de sua queima. Com esse tratamento a palha se torna semelhante ao bagaço, minimizando os efeitos nocivos da sua queima. Frise-se que a diminuição das queimadas tem contribuído para o aumento da quantidade de palha disponível nos canaviais. Razoes técnicas e econômicas avaliadas no trabalho levaram à adoção deste ultimo cenário. Ao justificar a lixiviação e secagem da palha Aristides utilizou dados, de 2008, de um pesquisador das Ilhas Mauricio, pois no Brasil essas informações ainda não foram levantadas.

O pesquisador adotou como foco dos estudos de caso três situações distintas: apenas a queima do bagaço, a queima do bagaço com a palha e a queima do bagaço com a palha e o biogás. A partir das simulações e da metodologia empregada ele concluiu pelo uso simultâneo do bagaço, com 50% em massa de palha produzida e de todo o biogás proveniente da vinhaça, mistura que se mostrou técnica e economicamente mais vantajosa no período da safra.

Já na entressafra o custo compensa a produção de energia elétrica através da queima de eucalipto, pois as caldeiras que queimam bagaço, palha e biogás não precisam ser modificadas. A indicação se justifica porque o poder calorífico do eucalipto está próximo ao do bagaço e em algumas regiões do país seu plantio é vizinho às lavouras de cana.

Aristides conclui, portanto, que, durante a safra, todo o bagaço, 50% da palha resultante da colheita e todo o biogás produzido pela biodigestão anaeróbica da vinhaça, que dá origem ao gás metano, devem ser utilizados e que o melhor tratamento para a palha é a trituração, lixiviação e secagem. Com vistas à produção de energia elétrica na entressafra a queima do eucalipto revelou-se a mais adequada. A energia elétrica produzida nesse período seria destinada à exportação. Apesar de as usinas de açúcar e destilarias de etanol serem autossuficientes na produção de energia elétrica, elas utilizam atualmente apenas o bagaço e poucas se valem do uso da palha e do biogás. A palha geralmente é deixada na lavoura e o biogás perde-se quando a vinhaça é espalhada por ela.

Publicação
Tese: “Avaliação termoeconômica da cogeração no setor sucroenergético com o emprego de bagaço, palha, biogás de vinhaça concentrada e geração na entressafra”
Autor: Aristides Bobroff-Maluf
Orientador: Caio Glauco Sanchez
Unidade: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM)



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