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Prefeituras querem antecipar receitas com royalties para fechar contas
Algumas cidades vão recorrer ao mercado financeiro usando a receita futura como garantia de empréstimos
A crise fiscal por que passam estados e municípios brasileiros tem um componente extra nas cidades fluminenses, especialmente as localizadas no norte do estado e na Região dos Lagos, que são mais dependentes de royalties do petróleo. Com a queda de 56% no preço do barril desde agosto de 2014, as prefeituras viram seus orçamentos encolherem de uma hora para outra. O efeito imediato foram medidas de ajuste, que vão desde corte nos salários do primeiro escalão do funcionalismo a paralisação de obras.
Mas a saída em que muitos estão apostando para não fechar as contas no vermelho é a antecipação de receitas futuras com royalties. Uma medida polêmica e que já ganhou campanha contrária na internet.
A queda na arrecadação com royalties e participações especiais (PEs) nos municípios fluminenses foi, em média, de 40% no primeiro semestre. Para cobrir essa diferença, algumas cidades vão recorrer ao mercado financeiro usando a receita futura de royalties como garantia de empréstimos. Na prática, é uma antecipação de receita. Isso será possível porque foi aprovada no Senado uma resolução autorizando o empenho das receitas futuras com royalties para contratação de crédito com instituições financeiras.
O valor dos empréstimos será determinado pelo seguinte cálculo: a diferença entre a média dos valores recebidos em 2013 e 2014 e os valores previstos para 2015 e 2016. As previsões serão feitas pela Agência Nacional de Petróleo (ANP).
PRESSÃO POR PLEBISCITO EM CAMPOS
Pela resolução, 60% do crédito terão que ser usados em saúde e educação. O resto é livre. Os municípios terão 20 anos para pagar, mas as parcelas não poderão superar 10% das projeções de receita com royalties em cada ano. Ao menos três cidades já aprovaram em suas câmaras municipais o projeto de lei para fazer uso desse recurso: Carapebus, Campos e Cabo Frio. Em Campos, a aprovação levou o Observatório Social da cidade — entidade sem fins lucrativos que fiscaliza gastos do município — a lançar a campanha “Royalties: Não venda meu futuro”. A ideia é propor um plebiscito sobre o assunto.
O sociólogo José Luis Vianna, do programa de pós-graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Candido Mendes de Campos, critica a medida. Primeiro porque as previsões da ANP podem não se confirmar. Segundo porque as cidades não se empenham para resolver um problema estrutural, que é a elevada dependência de um recurso finito e de preço instável. Ele lembra ainda que as medidas de longo prazo para elevar a arrecadação própria e diversificar a economia são urgentes porque a Lei 12.734/12, que redistribui os royalties por todos os municípios e estados, pode entrar em vigor em breve, o que levará, necessariamente, a um corte da receita com esses recursos — a lei está em discussão no Supremo Tribunal Federal.
— Vivemos uma crise de quem geriu as finanças municipais com a ilusão de ter acesso a uma riqueza inesgotável de recursos — diz Vianna.
Aluízio dos Santos Jr., prefeito de Macaé e presidente da Ompetro, que reúne municípios produtores de petróleo, sai em defesa das prefeituras:
— Não é razoável impor à população sacrifícios exorbitantes, consequentes da diminuição da oferta drástica de serviços públicos.
Em Campos, o secretário de Finanças Roberto Lannes diz que, sem a lei, não fecha as contas este ano. A prefeitura previa receita total de R$ 2,5 bilhões em 2015 e, agora, trabalha com R$ 1,5 bilhão. Por falta de pagamento, a distribuidora Ampla cortou o fornecimento de energia de prédios públicos da cidade em julho. Já foram demitidos 4 mil terceirizados e obras foram paralisadas.
DECRETO PARA REDUZIR GASTO
A nova unidade do Hospital São José, orçada em R$ 6,5 milhões e que atenderia a Baixada Campista (região pobre da cidade), foi uma das obras interrompidas. Segundo funcionários, a unidade seria inaugurada em outubro de 2014. Enquanto isso, pacientes são atendidos no hospital antigo, que funciona nos fundos da nova unidade, com janelas e portas quebradas, pintura descascando e filas a céu aberto mesmo em dias de chuva.
— Aqui é muito alvoroço. Acho que na unidade nova teremos mais espaço — diz o esperançoso Uelinton da Silva, que vai ao hospital dia sim, dia não para trocar o curativo do pé amputado.
O programa de casas populares Morar Feliz, que visa a retirar famílias de área de risco, também foi afetado. As obras estão devagar, mas a prefeitura diz que a meta de entregar dez mil casas populares até 2016 está mantida. Quanto ao hospital, não há data para inauguração.
Em Rio das Ostras, o desafio é administrar a queda de receita com a necessidade de investimento em infraestrutura para atender à população que mais cresce no estado. Nos primeiros sete meses do ano, a arrecadação com royalties e PEs caiu 59%. O município reduziu número de secretarias, cortou horas extras e tem travado uma briga com a Odebrecht Ambiental, responsável por obras de saneamento na cidade. Com o aperto na arrecadação, o pagamento à empresa passou a responder por mais de 80% dos recursos com royalties. A prefeitura editou, então, decreto que limita os pagamentos a Parcerias Público Privadas a 15% das receitas com petróleo e mantém sua posição amparada por uma liminar do Superior Tribunal de Justiça. A Odebrecht Ambiental disse em nota que já apresentou quatro propostas contemplando a redução do pagamento mensal e que não teve resposta da prefeitura. (O Globo)
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