Em 1998, chegou a hora de Sulamita Fejer se aposentar. A enérgica senhora argentina, que veio trabalhar no Brasil como representante de um centro tecnológico israelense, enfim poderia ter uma rotina mais tranquila. Só havia um problema. “Eu não sabia o que fazer com o resto do dia, depois do café da manhã”, afirma Sulamita. Assim, nos anos seguintes, ela usou o tempo livre para pesquisas e arrumou outras ocupações até que, em 2010, aos 80 anos, resolveu virar empresária.
Sulamita recebeu o iG no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), uma incubadora de empresas, na Universidade de São Paulo, onde 147 novas companhias estão sendo gestadas neste momento. A Initec, fundada por ela, não fica lá dentro, mas recebe ajuda deles para conseguir crédito, captar patrocínio, bolar planos de marketing, logotipo, banners e afins. Mas, afinal, o que ela vai vender? "O que vamos fazer, ninguém faz no mundo", afirma com certo mistério. E saca da maleta um protetor bucal.
A Initec criou um novo protetor bucal esportivo – o que fará dela concorrente da Adidas, por exemplo. A novidade é que eles são customizados para cada atleta, melhorando o desempenho esportivo. A peça leva em conta as características da cavidade bucal e permite adaptações necessárias ao diferentes esportes.
Sulamita evita falar muito sobre o produto pois prefere resguardar supostas inovações exclusivas que ele traz. Mas explica que seus protetores requerem uma “moldagem”, processo em que o dentista tira a cópia da boca do paciente, para então produzir uma peça única – que irá protegê-lo mais e também permitir que
respire melhor do que quando usa um protetor comum.
Mas, se ele é feito dessa forma quase artesanal, como produzi-lo em grande escala? Ela pensa em organizar mutirões. No momento, conversa com academias e federações esportivas. Garante que o processo é rápido e comercialmente viável. “Se 2 milhões de chineses quiserem usar, conseguimos fabricar”, diz. Sulamita também está criando uma rede de consultórios odontológicos parceiros, para descentralizar o processo.
Um protetor comum, conhecido como “aquece e morde”, pode ser comprado na farmácia por R$ 20. O dela, batizado de Sábio, custa R$ 180. Ela já vendeu algumas dezenas de unidades, mas afirma que o maior problema que enfrenta é cultural. “O atleta paga pela tatuagem, paga por uma camiseta de grife, mas não paga por sua proteção”, diz. “Para mim, o Sábio deixou de ser um produto e virou uma causa. O atleta brasileiro não está protegido da forma correta”.
Entenda como funciona o protetor bucal criado por Sulamita
“O protetor que ela criou dissipa o impacto, protegendo também a massa encefálica do atleta”, afirma Robson Bastos, diretor odontológico da Confederação Brasileira de Kickboxing e consultor da Initec. No Brasil, o uso do protetor é obrigatório no boxe e em lutas de contato. Nos EUA e na Europa, é usado num número maior de modalidades.
Alguns jogadores de futebol têm aderido aos protetores mais sofisticados, como Fábio, goleiro do Cruzeiro, e o atacante Cristiano Ronaldo, do Real Madrid. Mas, segundo pesquisas mostradas por Sulamita, 60% dos atletas não usam nenhum tipo de proteção bucal, 35% usam o tipo barato – o “aquece e morde” – e apenas 5% investem num modelo mais caro.
A empresária vê a Copa e as Olimpíadas que serão realizadas no Brasil como oportunidades de expandir a popularidade do protetor. Mas, sempre inquieta, reclama. “As autoridades estão preocupadas com aeroportos, estádios... E a saúde do atleta?” Será que isso, porém, fará uma senhora argentina torcer pelo sucesso
do futebol brasileiro nesses eventos? “Sim, no futebol, eu choro quando vocês choram, aplaudo quando vocês aplaudem”, garante. E logo faz a ressalva: “só fico dividida em jogos contra a Argentina...”
(iG) |